Nasci em Belém do Pará e, assim como muitas pessoas que vieram de outras regiões do país, ou mesmo do Tocantins e aqui se fixaram, também adotei Gurupi como a cidade do meu coração. Tenho por este lugar, que também é conhecido como "A Capital da Amizade", um carinho todo especial que beira ao bairrismo. Por isso digo com muito orgulho, sem desmerecer minha cidade natal, que sou gurupiense.
Por isso, senti-me muito honrado quando no dia 12 de junho de 1998, fui homenageado pela Câmara Municipal de Gurupi ao receber o Título de Cidadão Gurupiense durante uma concorrida sessão solene que contou com a presença de autoridades e de um expressivo publico.
Naquela mesma noite também estavam recebendo tal horária, a ex-deputada estadual Dolores Nunes (de quem fui assessor de imprensa no início da construção de Palmas), a maestrina Ruth Nogueira, regente do Coral Municipal Uirapuru, e Ana Aires Santana, primeira mulher eleita vereadora da cidade. Dona Aninha, como é mais conhecida, devido a problemas de saúde se viu impossibilitada de comparecer à sessão solene, mas foi devidamente representada pelo filho Zoroastro Henrique de Santana.
A sessão solene começou com a tradicional formação da mesa de autoridades e a execução do Hino Nacional Brasileiro. Em seguida, o então presidente da Casa, vereador Raimundo Moreira, convidou Antônio Sales Coutinho, figura bastante conhecida na cidade como Toim Ceguim, para que lesse um texto bíblico.
Todos ficaram surpresos com tal iniciativa do presidente, pois Toim Ceguim, assíduo freqüentador das sessões da Câmara, é deficiente visual e só possui 3% da visão. Ele diz que só enxerga vultos. Então, como ele iria ler a bíblia?
Pois bem. Toim não se fez de rogado. Saiu do meio da platéia, trajando calças jeans, gravata vermelha e um terno amarrotado cheirando a naftalina, levando a bíblia debaixo do braço e caminhou rumo à tribuna para cumprir a sua "missão". Em lá chegado, testou o microfone, certificando-se que tudo estava funcionando bem. Cumprimentou as autoridades presentes e o público em geral, sempre demonstrando tranqüilidade. Em seguida, abriu a bíblia na página desejada e sem rodeios, "leu" o texto – que não era curto -, com boa fluência verbal, deixando todos perplexos.
A sessão solene prosseguiu com as homenagens previstas no cerimonial, porém, a curiosidade continuava a me atormentar. Queria saber como o Toim tinha conseguido aquela proeza.
Ao término do evento, conversando com o presidente, fiquei sabendo que dias antes Toim o havia procurado para externar o seu desejo de "ler" o texto bíblico. A fórmula encontrada por ele para não fazer feio na sessão é simples: como possui uma memória prodigiosa, Toim havia treinado bastante, primeiramente, lendo o texto em Braile e depois o decorou.
Confesso que a sua interpretação da leitura foi impecável. Além de bom ator, o Toim Ceguim mostra que “enxerga” longe...
Zacarias Martins é escritor e jornalista, autor do livro “Histórias da História de Gurupi”. E-mail: [email protected]