João cap. 21: 15 -17.
No evangelho segundo são João, encontra-se registrado uma das maiores desilusões de um sonho utópico. Aqui é narrado o perfil humano dos mais calorosos seguidores de Jesus, bem como seus sonhos coloridos, mas também a vergonha e a fuga quando esses sonhos perderam suas cores.
O senhor Jesus havia terminado sua missão humanizada e conforme predito nas escrituras sagradas havia morrido em uma execução vergonhosa, “morte de cruz”. Era assim que o império romano tratava seus desafetos, e nesse caso específico, tinha a participação ativa do sistema religioso judaico, que enciumado do novo modelo de religião ensinada por Jesus, fez de tudo para que essa execução ocorresse apressadamente.
UM JULGAMENTO INJUSTO
Um tribunal foi montado às pressas, a prova testemunhal mesmo sendo a mais suspeita das provas, tinha ali valor incontestável. Jesus bem podia apelar para o tribunal superior como fez Paulo ao apelar para Cezar, atos 25.11, 26.32. Todavia o mestre não quis fazer, pois tinha consciência que sua hora era chegada coma já havia afirmado anteriormente. Jo 10.18,19, Luc 22.53.
Seus seguidores, mesmo os mais céticos haviam se enchido de esperanças de ver Israel voltar a ser nação independente através do seu messias redentor, cria piamente num novo Estado judeu, muitas promessas foram feitas, algumas muito atraentes do tipo: Vós assentareis em doze tronos julgando as doze tribos de Israel...
Alguns seguidores mais afoitos chegaram a pedir um assento a direita e outro a esquerda do rei Jesus quando o reino fosse instalado, era tudo muito eufórico; um reino com um rei que transformava água em vinho multiplicava pão e peixe para alimentar a multidão, era tudo que os judeus precisavam. Assim não haveria crise, mesmo em estado de sítio, Israel precisava de um rei assim! Ele havia chegado.
Num certo momento logo após a multiplicação dos pães, os judeus quiseram conduzi-lo à Jerusalém e aclamá-lo rei forçadamente, ele, porém não quis e fugiu do meio deles ocultando-se.
Era tudo muito confuso, havia uma turbulência social em alta proporção; queriam ele como rei, mas o rei das soluções alimentícias, o rei das festas sem crises, do sistema de saúde perfeito, pois Jesus curava as mais terríveis doenças, ressuscitava mortos, esse preenchia bem as conveniências. Certamente Roma não ousaria enfrentá-lo, assim pensavam.
Foi assim que Jesus viveu os últimos anos de sua vida humanizada, era pequeno demais para incomodar Cezar o imperador romano, mas muito perigoso para o sistema religioso judaico, que tinham nesse sistema de culto, a base de uma vida social e econômica de luxo.
Jesus mesmo no deserto e nas periferias incomodava os sacerdotes palacianos, as multidões o seguiam em estado de carência por que viam nele o conforto espiritual que nunca haviam visto no judaísmo.
O mestre estava ali ensinando o reino de Deus e libertando os cansados e oprimidos. Acho que se Jesus voltasse aqui novamente humanizado, o sistema religioso atual o mataria mais rápido e com mais crueldade, pois com certeza ele atacaria o os caciques do capitalismo religioso.
Naquela noite, ao ser julgado e depois executado na cruz uma nova avalanche social se inicia, os sacerdotes se sentem aliviados, o gasofilácio do templo volta a encher-se de dinheiro, os soldados executores ficam tranquilos, foi apenas mais um; nada fora da rotina, o tumultuador da ordem social foi eliminado, Roma e Israel estão em aparente paz.
E, os seguidores do messias morto! Onde estavam e como se sentiam? - Uma nuvem negra havia se espargido sobre seus sonhos, estavam decepcionados; haviam perdido tempo, dinheiro com a produção pesqueira, casa, família, redes e bascos. Mateus e Zaqueu já não eram mais coletores da alfândega romana, ao seguir Jesus deixaram tudo, sonhavam um novo sonho. Agora tinham os pés calejados das longas caminhadas pelo deserto na busca de um trono, de um reino, até ensaiavam esse momento cantando Hosana Nas alturas! O rei estava ali, podia apalpá-lo.
Mas que messias era esse? Multiplicou pão, tornou água em vinho, ressuscitou mortos e não conseguiu se livrar dos soldados romanos? Era tudo muito confuso!
Pedro e alguns discípulos voltaram ao mar para a retomada da profissão, o mesmo mar onde Pedro andara sobre as águas, agora era apenas refúgio de um sonhador frustrado. Pedro entrou no barco, tirou a roupa, ficou despido; Tamanha era a decepção que, já não tinha vergonha de sentir vergonha. Naquela noite nada apanharam isso não era comum para pescadores profissionais do mar da Galileia, algo estava errado; os peixes haviam fugido literalmente.
De madrugada, já quase ao amanhecer do dia viram alguém andando pela praia, era um homem, que num comportamento típico de pescador, acendeu um fogo, assou peixes e pão, e adicionou favos de mel e os convidou a comer. Quem rejeitaria um prato desses? O sabor perfeito da culinária oriental estava ali e o mestre desse saboroso prato, para surpresa de todos; era Jesus-ressuscitado!
Envergonhados e perplexos os discípulos correram ao encontro do mestre, comeram com ele e sob suas ordens lançaram as redes ao mar que se encheram de grandes peixes, aprendendo ali uma linda lição dita por Jesus: “Sem mim nada podeis fazer”. João 15.5.
Em seguida Pedro é chamado à parte por Jesus que o pergunta com qual tipo de amor ele o amava. Nas duas primeiras declarações Pedro admite amá-lo com o amor- fhileo, do Gr. Isso equivale a um tipo de amor emotivo, temporário e questionável, pois pode mudar e isso já estava acontecendo. Só ao ser perguntado pela terceira vez Pedro cai em si, e apela para a onisciência divina dizendo: “Senhor tu sabes que te amo”. Dessa vez usa em sua declaração o amor ágapo = a amor divino que finalmente é aceito por Jesus. Em seguida Jesus o convida a retomar o seu ministério pastoral e apascentar o seu rebanho, o que é aceito prontamente, tendo com resultado as maravilhas que se segue no ministério de um novo Pedro; capaz de morrer por amor ao seu mestre com quem fez uma nova aliança.
Seguir a Jesus na busca do que é apenas temporário tem se constituído num dos maiores erros da cristandade em todos os tempos, I Cor 15.19. O amor que nos une a Ele não pode ser condicional, oportunista, filosofal ou compensável com bens materiais. Tudo de bom que existe aqui é nosso e podemos desfrutar sem nenhum problema, mas tendo o cuidado de colocá-los em plano secundário, pois em primeiro lugar tem que estar em evidência, o amor a Deus.
João Gomes da Silva é escritor e teólogo, coordenador do seminário Paulo Leivas Macalão, em Colinas do Tocantins. E-mail: [email protected]