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Por: Daniel Lélis

O Carnaval de teorias inúteis

24 janeiro 2011 - 08h05

O Carnaval é a festa popular mais teorizada do mundo. Filósofos, antropólogos, sociólogos e até matemáticos (acreditem!) há muito tempo procuram entendê-lo. Livros e mais livros se lançam na missão de traçar o que seria um perfil científico deste que é o maior e mais festejado evento brasileiro. Pois bem. Este texto, esclareço desde já, não pretende o objetivo almejado pelos teóricos. E a razão é simples: o Carnaval não deve ser levado tão a sério; explicar o aquecimento global analisando as vestimentas da ala das baianas, por exemplo, é uma tolice. Sendo assim, proponho aqui uma análise bem menos pretensiosa, disposta tão somente a valorizar sem exagerar e a criticar sem menosprezar a mais importante festividade brasileira.

O Carnaval é democrático, profano, simbólico, alegre e cultural. É a oportunidade em que todos se unem na busca da diversão e do prazer; é a hora de pisar no falso moralismo e ver arte em belos seios à mostra; é o momento de expressar a criatividade, tornando qualquer bobagem numa grande e admirada bobagem; é o encontro da felicidade com o cansaço merecido e desejado; é a afirmação de uma cultura que resiste e se impõe; no Carnaval é como se por alguns dias, esquecêssemos das roubalheiras dos políticos, da desigualdade social, da violência...; é como se vivêssemos no melhor dos países, no mais feliz de todos. Temos aqui o delírio mais intensamente comemorado do planeta. Que bom que, mesmo iludidos, temos a chance de sermos felizes de vez em quando. Ponto para o Carnaval.


Bom, mas o Carnaval também parece ser para muitos um convite irresistível para a prática de atos irresponsáveis; é o excesso admitido e louvado como um deus; é a permissividade atraente e provocante; é a contemplação do conformismo que nos nega a oportunidade de ver além das fantasias, dos blocos, dos carros alegóricos. Em outras palavras, é como se fôssemos merecedores da felicidade apenas nos festivos dias de fevereiro. No resto do ano, só nos resta à realidade; e essa, nem preciso dizer, não é lá tão encantadora. Por fim, o carnaval, infelizmente, é uma propaganda enganosa, uma vez que passamos para o mundo a ideia de que vivemos no país mais liberal do mundo. Que aqui o respeito pelas liberdades grassa sem qualquer obstáculo. Bem. Um país em que as pessoas têm medo de sair de casa ante a possibilidade de serem assaltadas, agredidas e até mortas por qualquer bobagem, não é obviamente a capital da liberdade.

Um país que vê sem susto alguns de seus representantes enchendo de dinheiro público meias e cuecas, mas se sente horrorizado quando se depara com a possibilidade de ver a demonstração de amor entre duas pessoas do mesmo sexo, não é rigorosamente um país livre. É hipócrita.

Os méritos do Carnaval não afastam as suas facetas claramente desastrosas. Eles devem, antes de tudo, ser mantidos e fortalecidos de modo a possibilitar a superação, ou ao menos a redução, das consequências negativas aqui retratadas. Mitificar o Carnaval, embrulhando-o de uma seriedade inalcançável e sempre teórica, a fim de compreender tudo e todos, não ajuda em nada na consecução desse propósito. Melhor mesmo é valer-se do espírito crítico, prático e renovador que habita em cada um de nós. Este sim nos conduz ao amadurecimento que indiscutivelmente falta para lidar com a nossa maior festividade.

 

Daniel Lélis